19/02/2020

ACHEGÁNDONOS Á FIGURA DE RICARDO CARVALHO CALERO

FERROL 1916
Cinco duros pagábamos de aluguer.
Era um terceiro andar, bem folgado.
Pola parte de atrás dava para o Campinho,
e por diante para a rua de Sam Francisco.

No segundo vivia a minha tia aboa:
Tiña unha peza cheia de paxaros disecados
que só abria os dias de festa
para que os nenos disfrutásemos nela.

Ainda vivia minha mãe
e todos os meus irmaos viviam,
e em frente trabalhava o senhor Pedro o tanoeiro,
e a grande tenda de efeitos navais mantinha o seu trafego.

Na casa tinhamos pombas
e, por suposto, un grande gato mouro;
e o mue pai era novo ainda
e no mar do mundo cada dia descobria eu unha ilha.

Via o mar da minha fiestra,
e chegavam cornetas da marinha.
E baixava os degraus duas vezes ao dia para ir à escola,
e duas vezes rubia-os de volta.

As mulheres entom usavam capa e corsé,
e íamos à aldeia em coche de cavalos,
e a rua estava ateigada de pregons de sardinhas
e de ingleses que vendiam Bíblias.

Eu tinha un pacto con Deus:
que ninguén dos meus morreria.
E o pacto era observado,
e eu confiaba na perenidade do pacto.

Todo isto fica tam longe
que aduro podo ainda lembrá-lo.
Esqueceria-o dentro de pouco tempo
se non escrebese estes versos.

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